O “Direito Pod”, podcast dedicado ao mundo jurídico, recebe esta semana a advogada e educadora financeira Bruna Santos. Atuante na área de Direito de Família sob a perspectiva de gênero, a profissional explica que esse ramo do direito abrange todas as questões que envolvem as relações familiares — como guarda, alimentos, divórcio, inventário e doações — temas conhecidos como direitos sucessórios.
Segundo estudos recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o Brasil vivencia uma nova configuração familiar, marcada pela predominância de lares chefiados por mulheres. Bruna destaca que fatores como o envelhecimento populacional, a queda nas taxas de natalidade e o surgimento de famílias “multiespécies” — modelos que se distanciam da estrutura tradicional e incluem famílias homoafetivas, relações abertas e famílias com “filhos pet” — evidenciam mudanças profundas nas dinâmicas familiares.
As mulheres têm assumido papéis múltiplos, conciliando cuidados com o lar e atuação no mercado de trabalho, o que impacta diretamente na forma como essas relações se desenvolvem. Diante disso, o Direito precisa se remodelar para oferecer proteção adequada às novas realidades.
Com relações cada vez mais frágeis, nas quais casamentos e divórcios acontecem em intervalos curtos, o planejamento familiar torna-se essencial. Bruna reforça que planejar não é apenas uma etapa do divórcio, mas também do início de uma união. A escolha do regime de bens e das regras da convivência deve ser feita desde o começo para que, caso a relação termine, o processo seja o mais amigável e transparente possível.
No cotidiano do seu escritório, divórcios e ações de alimentos são realidade constante, especialmente em um cenário marcado por lares amplamente chefiados por mulheres solo. A advogada ressalta a grande vulnerabilidade dessas mulheres ao deixarem um casamento: muitas chegam fragilizadas emocionalmente e financeiramente, reflexo da ausência de educação, da transparência financeira e da sobrecarga com o cuidado dos filhos.
São mulheres exaustas, que buscam apenas o direito de recomeçar e, por isso, acabam renunciando ao patrimônio para evitar conflitos. Muitas vezes, cedem diante de chantagens emocionais, como ameaças de disputa de guarda compartilhada ou do lar de referência — embora estejam amparadas juridicamente. Para que essa mulher tome decisões mais equilibradas, a advogada explica que o processo frequentemente demanda apoio multidisciplinar, envolvendo psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais.
Mitos e verdades no momento da separação
Um ponto sensível nas separações é a discussão sobre alimentos, ainda marcada pelo mito de que “30% do salário” seria o valor ideal. A advogada explica que esse cálculo não existe na lei: os alimentos são definidos pelo trinômio: necessidade, possibilidade e proporcionalidade. A pergunta central é: quanto custa a vida dessa criança? E isso inclui não apenas necessidades básicas, mas tudo o que envolve seu desenvolvimento integral. Na prática, porém, a sobrecarga recai quase sempre sobre a mulher, que não deixa o filho desamparado, mas muitas vezes não consegue arcar com todas as despesas sozinha.
Bruna também esclarece as diferenças entre os tipos de divórcio. No Brasil, 81% dos divórcios são judiciais e 18% extrajudiciais. Os extrajudiciais, realizados em cartório, são mais céleres e dependem do comum acordo entre as partes, além da inexistência de filhos menores. Já o divórcio judicial é obrigatório quando há crianças ou adolescentes envolvidos, pois o Ministério Público deve garantir seus direitos. No divórcio litigioso, as partes apresentam suas divergências e cabe ao juiz decidir.
Outro tema que sempre gera controvérsia é a guarda dos filhos. Quem fica mais tempo com a criança deve ter esse fator reconhecido inclusive nas despesas, já que o tempo disponível interfere na renda e na rotina de trabalho. Além disso, questões emocionais mal resolvidas costumam influenciar as decisões. A mediação realizada pelo escritório de Bruna busca justamente filtrar informações, reduzir conflitos e mostrar que, apesar das diferenças, as decisões devem convergir para um único propósito: o bem-estar dos filhos.
As transformações sociais impõem ao Direito uma renovação constante. A legislação acompanha a evolução das famílias — às vezes respondendo a demandas já existentes, às vezes criando jurisprudência ou novas normas para situações ainda sem referência jurídica. Nesse processo, os advogados têm um papel essencial como agentes que provocam a mudança, criando precedentes e entendimentos que garantam segurança às relações familiares.
Bruna conclui com um alerta fundamental: “A ignorância não é uma bênção quando se trata de garantir os seus direitos. Busque conhecer e se informar. Só quando você sabe o que a lei assegura pode, de fato, exigir”.
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